Galeria dos Mártires - Nestor Paz Zamora

NESTOR PAZ ZAMORA
Mártir das lutas de libertação de seu povo
BOLÍVIA * 08/10/1970

Nestor Paz Zamora, filho de um general boliviano. Nestor fez estudos teológicos, vinculou-se desde cedo ás Fraternidades de Charles de Foucauld e era estudante de medicina quando se incorporou á guerrilha de Teoponte, onde morreu de fome. 

Toda sua vivência de cristão místico e militante está admiravelmente contida nas páginas do Diário que dedicou à sua esposa, Cecy. Um verdadeiro testamento de espiritualidade libertadora. Irradiava o sentido transcendente que ele encontrou em sua luta pela “terra nova”, onde o amor fosse à lei fundamental.

Em 12 de agosto escreveu: “Sou um fermento que vai trabalhando muito por igual. Esta é pelo menos a sensação que tenho. Uma grande paz e tranquilidade me invadem. Estou ‘vitalmente’ passando da ideia da ‘morte’ como diminuição para a ideia da ‘morte’ como plenitude e passo a uma nova dimensão. Não a procuro, mas se vier a esperarei com a serenidade e a tranquilidade que merece tal momento, e mesmo lhe pedirei que avise a eles que passei ao Pai, que o ‘Vem, Senhor Jesus’, tornou-se realidade em mim”.

De seu diário de guerrilha:

Sábado, 12 de setembro
Meu querido Senhor:
Estou escrevendo depois de muito tempo. Hoje de fato me sinto necessitado de ti e de tua presença, talvez seja a proximidade da morte ou o fracasso relativo da luta. Sabes que tenho procurado por todos os meios ser fiel a ti.

Consequente com meu ser em plenitude. Por isso aqui estou. Entendo o amor como uma urgência em solucionar o problema do outro onde tu estás. Deixei o que tive e vim. Hoje talvez seja a minha Quinta-feira e esta noite a minha Sexta-feira.

Em tuas mãos entrego-me inteiramente; o que me dói é talvez deixar o que mais quero neste mundo, a Cecy e minha família, e talvez não poder sentir concretamente o triunfo do povo, sua Libertação.

Somos um grupo cheio de plenitude humana, “cristão”, e isso, creio, é bastante para impulsionar a História. Isto me conforta. Amo-te e te entrego o que sou e o que somos, sem medida porque és meu Pai. Morte alguma será inútil se sua vida estiver plena de sentido e isso, penso, é valido aqui entre nós. Tchau, Senhor, talvez até o teu céu, essa terra nova por que tanto ansiamos.

Sexta-feira, 2 de outubro
Minha querida rainha:
Faz muitos dias que não escrevo porque me faltava ânimo. Ontem recordei muito tudo o que é NOSSO. Estamos passando momentos extremamente difíceis e duros. Meu corpo está desmoronado, mas meu espirito permanece intacto. Quero entrega-lo a ti em primeiro lugar e aos outros. Amar-te com a plenitude de minhas forças, com tudo que posso, pois tu encarnas minha vida, minha luta e minhas aspirações. Dia 9 dificilmente poderemos estar juntos, talvez dia 29 ou pelo Natal.

Mas tenho confiança que assim será. Somos um grupinho pequeno. Tenho a sorte de estar ao lado de companheiros que também são amigos ou parentes e isso me dá mais tranquilidade. É difícil a esta altura não desesperar e é a confiança no Senhor Jesus que me dá ânimo para seguir até o fim. Perdemos a batalha, ao menos esta, irremediavelmente. Devemos recobrar ânimo e ver com critério claro e realista o que faremos no futuro. Vamos ver o que será.

Oxalá não seja para além da morte nosso encontro, embora este seria superabundante de felicidades. Creio nesta verdade e também me consola porque é real. Espero estar em breve junto de ti. Conversar longamente, olhar-nos nos olhos, trazer ao mundo um Pazuelopis ou uma Pazuelopita, que nos alegre os dias e tocar para frente. Tenho medo que te aconteça alguma coisa, espero, porém, que estarás bem. Enfim, me despeço.

Como sempre o papel é um limite sério, não sirvo para escrever, apenas posso expressar-me. Penso nos velhos. Em meus irmãos e irmãs. Logo os abraçaremos. Quero, e isso é o principal, comer, comer, comer nos primeiros dias, pois já faz um mês que não comemos, a não ser comidinhas esporádicas do que encontramos. Eu te amo muito. Que isso fique bem claro. És o que mais amo e o que amo em plenitude... 
Nestor Paz Zamora

Texto elaborado por Tonny, da Irmandade dos Mártires da Caminhada.

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